O projeto Saúde e Natureza oferecerá gratuitamente em Goiás banhos de floresta a usuários do SUS (Sistema Único de Saúde) com sintomas de transtornos mentais. A iniciativa segue orientações de um levantamento global feito pelo Cabsin (Consórcio Acadêmico Brasileiro de Saúde Integrativa), que reúne 106 pesquisadores e aponta que a exposição à natureza melhora atenção, sono e bem-estar emocional, além de reduzir sintomas de ansiedade e depressão.
Cinco parques do estado começarão a receber a prática em novembro. Os encontros, com duração de 90 a 120 minutos, vão acontecer semanalmente ao longo de oito semanas. A proposta é reduzir o estresse e promover o bem-estar por meio da conexão sensorial com o ambiente natural, técnica criada no Japão nos anos 1980 e conhecida como shinrin yoku (banho de floresta).
“O banho de natureza é uma experiência multissensorial, em que a pessoa se reconecta à paisagem e aos elementos naturais, como cheiros, sons, texturas e temperatura. Isso ajuda a restaurar a atenção, aliviar a mente e reduzir sintomas de ansiedade e depressão”, explica o médico pediatra e oncopediatra Ricardo Ghelman, coordenador do Cabsin e consultor da OMS (Organização Mundial da Saúde).
O projeto goiano é uma parceria da Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás), da UFG (Universidade Federal de Goiás) e da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). A iniciativa foi inspirada no projeto Banho de Floresta de São Bento do Sul (SC), realizado desde 2023 pela Secretaria Municipal de Saúde e pelo Cempics (Centro Municipal de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde).
Em São Bento do Sul, as atividades acontecem em uma trilha urbana dentro de um ecoparque, abertas a usuários do SUS. Os participantes apresentaram melhorias na saúde mental e emocional, redução ou normalização da pressão arterial, além de desenvolverem biofilia —vínculo afetivo com a natureza. Muitos relataram sensações de calma, leveza e bem-estar após os encontros.
“Essa experiência catarinense mostrou que a regeneração da natureza e a regeneração humana caminham juntas”, afirma Ghelman. “As participantes relataram mais disposição, melhora do humor e até redução de sintomas físicos.”
Em Goiás, os participantes serão encaminhados por Caps (Centro de Atenção Psicossocial) e UBS (Unidade Básica de Saúde). “A ideia é oferecer uma intervenção não medicamentosa para pessoas com sintomas leves a moderados de ansiedade, depressão e insônia. Trata-se de uma forma segura, acessível e sustentável de cuidado”, diz Ghelman.
As atividades serão realizadas em unidades de conservação de proteção integral, como o Parque Estadual da Serra de Caldas Novas e o Parque Altamiro de Moura Pacheco, guiadas por educadores ambientais e profissionais de saúde capacitados. Os participantes passarão por exames clínicos antes e depois da intervenção para medir, com base científica, o impacto da natureza na saúde física e mental.
O psicanalista Artur Costa, professor sênior da ABPC (Associação Brasileira de Psicanálise Clínica), reforça que os efeitos vão além do fisiológico. “O contato com ambientes naturais ajuda a pessoa a se reconectar e se afastar das pressões da vida urbana”, diz. Ele observa melhora da disposição, do sono e do humor, além do fortalecimento da sensação de pertencimento à natureza.
A secretária estadual de Meio Ambiente, Andréa Vulcanis, destaca que o projeto representa uma transformação na forma de fazer política ambiental no Brasil. A partir do segundo semestre de 2026, o programa deve ser ampliado para dez áreas verdes municipais.
“Embora saibamos empiricamente que estar em contato com a natureza faz bem, queríamos comprovar isso cientificamente. É a partir desses dados que poderemos redesenhar políticas públicas, tanto na área ambiental quanto na de saúde”, afirma. Ela acredita que os resultados obtidos em Goiás podem inspirar novas políticas no Brasil e no exterior, com apresentação prevista na COP 30, em Belém, em 2026.
O Mapa das Evidências da Efetividade Clínica das Intervenções Baseadas na Natureza, feito na primeira etapa do projeto, será disponibilizado ao público em novembro no site da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde).
O estudo reuniu 312 revisões sistemáticas publicadas desde 2010 em bases internacionais, e 93,6% dos resultados analisados mostraram efeitos positivos ou potencialmente positivos sobre saúde mental, física e bem-estar.
As intervenções baseadas na natureza vão além dos banhos de floresta e atividades em áreas naturais. Incluem também ações urbanas, como jardins terapêuticos em hospitais, hortas comunitárias, corredores verdes e florestas-escola. Há ainda experiências com “natureza digital”, em que pacientes hospitalizados utilizam realidade virtual para simular o contato com ambientes verdes.
O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde.